Este working paper foi construído a partir de olhares interdisciplinares com o objetivo de revelar a diversidade cultural dos povos originários e apresentar os desafios enfrentados pela atenção à saúde dessa população. O documento também reúne recomendações para que a gestão pública possa oferecer melhores perspectivas de um desenvolvimento saudável às primeiras infâncias de cada etnia.
Um dos aspectos fundamentais para o êxito na atenção primária à saúde é a construção de vínculos com a comunidade, sobretudo no contexto da saúde dos povos indígenas. Profissionais de saúde devem respeitar e considerar esses aspectos para promover o desenvolvimento integral das crianças nas comunidades indígenas
Conceitos-chave
A publicação traz alguns conceitos-chave essenciais para aprofundar entendimento do tema de desigualdade em saúde de crianças indígenas.
Saúde no contexto indígena
Cada etnia indígena tem entendimentos próprios sobre os cuidados necessários para se ter um corpo saudável. Eles incluem rituais, técnicas corporais e estímulo à ingestão de determinados alimentos. Assim, as compreensões próprias sobre a gestação, o parto e o pós-parto estão intrinsecamente relacionadas à forma como estes povos cuidam da saúde das mães, das crianças e dos bebês, incluindo preocupações com a placenta e o cordão umbilical, que, para algumas comunidades, são objeto de extremo cuidado.
Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI)
Criada em 2002 pelo Ministério da Saúde, tem como objetivo a proteção, promoção e recuperação da saúde dos povos indígenas a partir da diversidade social, cultural, geográfica, histórica e política de cada população.
Cosmologia
Refere-se ao sistema de crenças, mitos, rituais e conhecimentos sobre a origem, estrutura e funcionamento do universo conforme entendido por uma determinada cultura ou sociedade. Ou seja, ela molda a visão de mundo de uma comunidade, influenciando sua organização social, práticas religiosas e valores fundamentais.
Iniquidade
É um termo utilizado em referência à injustiça ou desigualdade acentuada, especialmente em termos de distribuição de recursos, oportunidades ou formas de tratamento.
Povos indígenas isolados
São grupos indígenas com ausência de relações permanentes com as sociedades nacionais ou com pouca frequência de interação, seja com os não indígenas, seja com outros povos indígenas.
Povos Indígenas de recente contato
São povos ou grupos indígenas que mantêm relações de contato permanente e/ou intermitente com segmentos da sociedade nacional e que, independentemente do tempo de contato, apresentam singularidades em sua relação com a sociedade nacional e seletividade – autonomia – na incorporação de bens e serviços.
Raio-X da publicação
De acordo com o censo 2022, a população indígena do brasil chegou a 1.693.535 pessoas, o que equivale a 0,83% dos 203.080.756 de habitantes do país. Ela está distribuída entre 305 diferentes etnias e presente nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal
O que é saúde no contexto indígena?
“>Cada etnia indígena tem entendimentos próprios sobre os cuidados necessários para se ter um corpo saudável, que passam por rituais, técnicas corporais e estímulo à ingestão de determinados alimentos. As crianças são o público mais sensível e o mais atingido pelas diversas interferências externas que afetam a saúde desses povos.
O que é saúde no contexto indígena?
Apesar de ter caído de 2018 a 2022, a taxa de mortalidade entre bebês indígenas segue 55% superior à de não indígenas.
“>O número de mortes de crianças indígenas de até 4 anos é mais que o dobro de crianças não indígenas.
Principais causas da mortalidade infantil indígena
“>Em termos proporcionais, crianças indígenas morrem mais por doenças evitáveis do que as não indígenas.
Segundo dados do Datasus, quando as causas são relacionadas a doenças do aparelho respiratório, doenças infecciosas e parasitárias ou doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas, a proporção entre não indígenas é de apenas 14%, enquanto entre os indígenas sobe para 38%.
Essa discrepância sugere que, ao longo da vida das crianças indígenas, as enfermidades se apresentam como um fator de risco ainda mais alto do que entre as não indígenas. A falta de acesso facilitado a serviços de saúde preventiva e a tratamentos resulta em uma alta proporção de mortes por causas evitáveis nesse grupo populacional.
Recomendações baseadas em evidências
O cuidado integral das infâncias indígenas demanda ações de diferentes naturezas. Conheça algumas recomendações.
Garantir acesso
Com a oferta de veículos adequados a cada território, os profissionais de saúde conseguem chegar aos povos indígenas, enquanto estes devem conseguir trânsito para ir até o serviço de atendimento quando necessário.
Capacitar profissionais
É necessário adaptar o cuidado em saúde das equipes do Estratégia Saúde da Família e de programas de visitação domiciliar à luz da cultura e dos saberes indígenas.
Integrar os sistemas de saúde
Com dados e evidências em mãos, os gestores podem acompanhar de forma mais atenta as ações em cada local e reconhecer avanços e limites de cada política.
Monitorar melhor a frequência do atendimento
É fundamental assegurar a atenção às gestantes, puérperas e crianças na primeira infância e o devido cumprimento do calendário previsto de atendimento para cada caso.
Proteger o meio ambiente
A fiscalização é chave para evitar a invasão dos territórios indígenas, bem como o financiamento de pesquisas de avaliação do impacto das mudanças climáticas e agressões à terra nas doenças e mortes de crianças indígenas.
Para mais recomendações, acesse o conteúdo completo
Autores
Emilene Leite de Sousa
Professora associada da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) no programa de pós-graduação em Sociologia e de pós-graduação em Ciências Sociais e membro dos grupos de pesquisa GECI (UFMA) e CRIAS (UFPB).
Márcia Maria Tavares Machado
Professora associada do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), cientista chefe da FUNCAP e integrante do Comitê Científico do NCPI.
Natacha de Souza Silva
Nutricionista referência técnica do Núcleo de Saúde das Mulheres, Crianças e Vigilância Alimentar e Nutricional da Divisão de Atenção à Saúde Indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena de Porto Velho (DIASI/DSEI/ PVH) e tutora do Método Canguru na atenção básica.
Tayná Albuquerque Tabosa
Fisioterapeuta com especialização em Neonatologia e mestrado em Fisioterapia e Funcionalidade, é doutoranda em Saúde Pública na UFC e possui pesquisa em saúde da criança e desenvolvimento infantil.
Revisão técnica
Beatriz Vera
Grupo de pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento que se reúnem para sintetizar evidências científicas, colaborando assim com o fortalecimento de políticas voltadas ao enfrentamento dos principais desafios encontrados pelas primeiras infâncias no país.
Colaboração
Lucimar Rosa Dias
Professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pesquisadora das infâncias e diversidade e coordenadora do Grupo ErêYá, além de integrantes do Comitê Científico do NCPI
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