Este working paper discute a intersetorialidade, que consiste na integração e colaboração entre diversos setores governamentais, privados e da sociedade civil, a partir de seus diferentes saberes, com a finalidade de solucionar problemas sociais complexos. É um aspecto fundamental da provisão de políticas de promoção do desenvolvimento infantil.
O material apresenta uma série de evidências sobre a importância da intersetorialidade para a promoção do desenvolvimento integral; um balanço das lições aprendidas com algumas políticas e intervenções já implementadas, com indicação de estratégias possíveis para a superação de barreiras encontradas pelo caminho; e aponta recomendações para políticas intersetoriais de primeira infância.
Para que políticas intersetoriais atinjam seu potencial, a colaboração e a clareza de papéis entre os envolvidos são indispensáveis, assim como a flexibilidade para adaptar estratégias às realidades locais, garantindo impacto positivo no longo prazo.
Conceitos-chave
A publicação traz alguns conceitos-chave essenciais para aprofundar no tema da intersetorialidade em políticas públicas para a primeira infância.
Coorte
Tipo de estudo que acompanha grupos de pessoas ao longo de um determinado tempo. O objetivo é observar ao que elas foram expostas (como hábitos, condições de vida ou intervenções) e entender como esses fatores afetam suas vidas e saúde no futuro.
Cuidado integral
O modelo do cuidado integral (nurturing care framework) relaciona o desenvolvimento infantil a determinantes de vários níveis e é centrado na noção de cuidado responsivo. Ele procura identificar as condições para que a criança atinja seu potencial de desenvolvimento a partir da atenção a cinco domínios: boa saúde, nutrição adequada, oportunidades de aprendizado, proteção e segurança e cuidado responsivo.
Cuidado responsivo
Cuidados responsivos envolvem a sensibilidade para reconhecer os movimentos e sons de uma criança, como sinais de comunicação desde o nascimento, e a responsividade para atender adequadamente a esses sinais.
Governança colaborativa
Trata-se de um arcabouço que garante a legitimidade de uma política pública por meio da participação de todos os atores envolvidos. Seu sucesso depende da definição conjunta de objetivos com os atores estratégicos, em um processo contínuo de diálogo e análise de resultados, que fortalece a interação entre tomadores de decisão e partes interessadas.
Intersetorialidade
É a integração e coordenação de ações e políticas que envolvem múltiplos setores e atores. Seu objetivo é promover soluções eficazes e sustentáveis para problemas complexos.
Raio-X da publicação
Políticas intersetoriais são opções mais adequadas para lidar com os fatores de risco ao desenvolvimento infantil. Isso porque, além de possuir múltiplos determinantes, os fatores de risco ao desenvolvimento infantil interagem de forma complexa e tendem a atuar de forma conjunta, persistente e acumulada ao longo do tempo.
Quando não há coordenação entre os órgãos e setores, populações mais vulnerabilizadas, como crianças pequenas, passam despercebidas para os sistemas que deveriam protegê-las. Isso diminui a capacidade de identificar as necessidades e dificulta o acesso aos serviços essenciais e aos direitos básicos que poderiam fazer a diferença em suas vidas.
Multisetorial ou Intersetorial?


Quais os benefícios da intersetorialidade?
1. Sustentabilidade em longo prazo
2. Maior eficiência das intervenções devido à sinergia entre áreas
3. Maior custo efetividade das políticas
E os desafios?
1. Dificuldade em garantir orçamento de longo prazo
2. Dificuldade de articulação e engajamento
3. Maior esforço de coordenação
O que as evidências científicas apontam sobre a intersetorialidade no desenvolvimento infantil?

Quando componentes do cuidado integral são incorporados a programas ou políticas públicas existentes, há efeitos positivos sobre o desenvolvimento infantil.

Quando ações de áreas distintas são combinadas, elas potencializam os efeitos umas das outras.

O desenvolvimento integral conta com várias dimensões e por isso a criança e sua família precisam de ações especificamente direcionadas para cada uma delas. Algumas combinações de ações podem ter caráter aditivo, e não sinérgico, então é possível integrá-las para lidar com aquelas diferentes dimensões.
O que já funcionou

Programa Bolsa Família (Brasil)
Programa de transferência de renda que usa condicionalidades como a vacinação obrigatória e frequência escolar. O benefício para famílias com crianças de 0 a 6 anos ampliou de 64% para 84% a proporção delas fora da linha de pobreza

Chile crece más (Chile)
Coordena atores e fortalece programas locais, expandindo atendimentos sem sobrecarregar estruturas. Ao aumentar os atendimentos dentro de estruturas já existentes, se tornou modelo de escalabilidade e coordenação contínua.
Recomendações baseadas em evidências
As estratégias recomendadas incluem uso de infraestrutura existente, monitoramento constante e fortalecimento da governança colaborativa.

Planejamento para gestores públicos
Defina o escopo da política, seu objetivo e metas de intervenção e de resultado. Mapeie ações prioritárias, identifique sinergias e desenvolva metas conjuntas que estabeleçam colaboração entre as partes.

Preveja a intersetorialidade em legislação
Leis institucionalizam a cooperação entre diferentes áreas, setores e atores e garantem a continuidade das ações intersetoriais.

Espaços coletivos para tomada de decisões
Defina claramente as responsabilidades de cada setor e crie comitês ou grupos intersetoriais que favoreçam a tomada de decisões coletivas.

Promova ações de sensibilização e mobilização
Engaje meios de comunicação para conscientização, crie conexões com a comunidade e mobilize redes capazes de fortalecer as iniciativas e ampliar o alcance das ações.
Para mais recomendações, acesse o conteúdo completo
Autores
Bruno Kawaoka Komatsu
Doutor em teoria econômica pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é assessor de pesquisa na Cátedra Ruth Cardoso do Insper e professor no Programa Avançado em Gestão Pública do Insper.
Claudia Cerqueira do Nascimento
Doutora em administração pública e governo pela Fundação Getúlio Vargas e docente convidada da mesma instituição. Foi pesquisadora no Cebrap, diretora técnica na Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo e atualmente é gestora executiva do Centro Brasileiro de Pesquisa Aplicada à Primeira Infância (CPAPI).
Naercio Aquino Menezes Filho
Doutor em economia pela University College London, é professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no Insper, professor associado da Universidade de São Paulo (FEA-USP), membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Ordem Nacional do Mérito Científico, diretor do Centro Brasileiro de Pesquisa Aplicada à Primeira Infância (CPAPI) e coordenador do Comitê Científico do NCPI.
Revisão técnica
Comitê Científico do Núcleo Ciência pela Infância
Grupo de pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento que se reúnem para sintetizar evidências científicas, colaborando assim com o fortalecimento de políticas voltadas ao enfrentamento dos principais desafios encontrados pelas primeiras infâncias no país.
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